segunda-feira, 31 de dezembro de 2012

Fronteiras - pra 2013



Comprei um guia de viagens. Ele é lindo, cheio de fotos e lugares e mapas. Eu adoro mapas. Aprendi a pirar com eles na minha infância, lendo O Senhor dos Anéis. É bonito mudar de perspectiva, ter uma dimensão do todo, ver aquele monte de nomezinhos e constatar que há muitos lugares para se conhecer nessas vidas, muita gente, muita história.
Há um tempo saí das páginas de dicas de viagem e caí na estrada. Deu um frio na barriga, o famoso medo do desconhecido. Milhões de “e se” passaram pela minha cabeça. No fim deu tudo certo, mesmo com todos os erros e perrengues. Foi linda experiência. Aumentei o tempo na estrada, no segundo mochilão, e fui para terras de outro idioma, de muitas culturas novas. Que medo eu tive de não conseguir me comunicar, de me perder, de perder os outros! Foi uma vida inteira, numa pequena capsula de tempo. Aprendi a gostar dos perrengues, aprendi a importância de me pôr sempre em questão.
Desde então a estrada virou parte da minha vida, parte de mim, e eu parte dela. Sempre que posso vou visitá-la, porque – boa companhia que ela é – ela sempre me leva para lugares fantásticos, com gente incrível, com lições de vida.
A estrada, um entre, passou a ser também um onde, um lugar. Aprendi a ver além. Eu descobri que aquelas linhas que marcavam fronteira nos mapas não podiam ser mais vagas. Quero dizer, é claro que há diferenças em cada lado da fronteira. Mas no fim é tudo terra corrida. É tudo gente que ri, e chora, e canta e ama. Tudo família.
Dissolveram-se todas as fronteiras. Já disse Jorge Drexler que las fronteras se mueven como las banderas. O mesmo acontece com as fronteiras temporais. Ano que vem é hoje, cada dia carrega uma vida inteira. A noite pode ser o começo de muitas coisas, o dia pode ser hora de descansar. Cada minuto é um ano a mais, uma nova promessa, a vontade de alcançar a utopia. O amor também não tem tempo nem fronteira. O frio na barriga, o medo do incerto, os perrengues, tudo vale a pena aqui também. E os fins não são mais que novos começos, com um entre para respirar. Felicidade não tem tempo, lugar, porquê. A vida é isso, multi, pluri, inter, trans, una e tantas.
E meu desejo de novos ares (ou novos anos, como cada um preferir) é justamente brincar de corda com as fronteiras da vida. Sê livre, a terra é tua, o tempo é teu.


sábado, 15 de dezembro de 2012

... das águas



I

Você tem razão, aqui parece que não acontece nada.
Aqui acontece tudo, tudo, mas parece que não acontece nada.
Parece que não aconteço nada...
                Sinto falta do mar. Parece tão longe. Aqui parece tudo tão longe.
Quando é que o mar vai me levar?
Pronde é que o mar vai me levar?
                Sinto falta de ser navegador de mim.
                Tenho medo de naufragar nesse vácuo turbulento que me leva.
Quando é que o mar vai me levar?
                Quando? É que o mar vai me levar...
                               Quando é o mar, vem me levar.


II

É engraçado como cabe uma casa toda nesses 70 litros. A vida não precisa de mais que isso e uma boa companhia.


III

Eu nem sei por que lembro de você. Quando a gente desmergulha do sentimento e vê ele parado mais de longe até esquece a fundura que era.
Meu negócio é andar é por isso. Ali na estrada, pé na terra, parece que tudo isso aí vai se borrando, se dissolvendo no suor e sal. Vai deixando de ser importante, porque a natureza é bonita demais; o cansaço e o peso da mochila são revigorantes; a dor no corpo, a fome e os borrachudos incomodam com mais verdade, e a gente vê que o mundo segue mundo, com dor ou sem dor, com a gente ou não. E quando cê já tá pedindo arrego aparece uma água daquelas verdes ou azuis pra te sanar.
Nessas coisas todas a gente vê com mais clareza. O amor que doía vira saudade bonita dos tempo bom, o trabalho que cansava vira a risada dos companheiros de dia-a-dia, a família tão crítica vira momento de carinho e vida compartilhada, e os amigos, ah, esses são lembrança em cada farfalhar de folha.
É aí que a gente percebe que felicidade não tem desculpa, nem tempo.