quinta-feira, 22 de maio de 2014

O som da última espada caída



Aqui não há
nenhum cão uivando à lua.
Lá fora,
Só o barulho dos pneus
sobre o asfalto seco
e o baixo zunido
da melancolia restante
de carnavais passados,
som monótono proveniente
do inflamado e descamante
desamor fetichizado.
E o som distante
do diapasão da vida
tentando afinar esse caos todo...

Nem uma gota d’água.
Cubos de gelo, porém,
resolvem precipitar
como lançados por uma
atiradeira dos céus.

Aqui dentro
uma calmaria reflexiva
e cansada,
de quem ganhou a batalha
a custa de muitas vidas.

O som
da última espada caída.
É o que resta.
É o alto preço que se paga,
por não se saber dialogar
consigo mesmo.

quinta-feira, 1 de maio de 2014

Cicatrícula



Hoje ouvi dizer duma pesquisa sobre a palavra mais bonita do Português. Algo do tipo TOP 10 da Língua Portuguesa. Imagino que os critérios do público participante sejam tão aleatórios quanto os de qualquer concurso de beleza, mas de qualquer forma tomei um minuto para refletir sobre, já que nessa semana também me foi proposta a pergunta “o que é beleza para você?”.
Acho esse tipo de pergunta bastante cretina, porque de duas uma: ou damos uma opinião superficial para sanar a urgência da resposta, ou podemos passar o resto da vida pensando sem chegar a nada muito definido, devido à dificuldade do que nos foi proposto (deixando claro que essas perguntas “cretinas” são lindas e necessárias. Podemos não chegar a uma resposta, mas no ato de pensar vamos além).
Não fiz uma reflexão profunda e sincera com relação ao Português, mas me atenho à primeira palavra que me veio à cabeça: cicatrícula.
CI-CA-TRÍ-CU-LA, olha que lindeza, que som! Quem prestou atenção nas aulas de biologia do Ensino Médio lembra o significado, mas o que proponho para essa palavra não é o conteúdo, e sim a sonoridade e a gama de possibilidades interpretativas que ela permite. Poderia ser um daqueles vocábulos camaleões que se adaptam ao contexto:
Para alguma coisa muito boa, bem feita: a revista desse mês tá uma cicatrícula! Boa mesmo!
Para um momento de raiva: FILHO D’UMA CICATRÍCULA!
Para um momento de deslumbre frente a um fato ou paisagem desconcertantes: Cicatrícula! (e o queixo caído).
No caso de um problema: cara, tô com uma cicatrícula...
Desde meu primeiro contato com a palavra, lá pelos 17 anos, foi amor à primeira ouvida. Tá na minha lista de mais bonitas do Português. Quanto a ovos e vitelos, nada a declarar.